XX — O
Julgamento
O
que passou, passou?
Outro
dia, ouvi alguém comentar que vivemos tão apegados, que nem o ar nós soltamos! Assim,
respiramos de forma curta, sem soltar o ar completamente durante a expiração. Por
isso, revise-se e solte-se. Deixe de fazer o ar de seu refém! Solte-o – até
porque o ar que não soltamos, nem é mais oxigênio, e sim, gás carbônico!
O
passado pode se tornar como esse gás carbônico também até. Ele pode ter nos
nutrido em outrora, porém hoje nos intoxica. O passado pode ter sido
inspiração, mas hoje é expiração; por isto, solte-o! E, caso tenha sido algo
trágico, ficar remoendo isto também é venenoso.
Aceite
o passado. Pegue o aprendizado que ele trouxe e siga em frente. Até porque ele
só tem existência psicológica. O passado só existe em suas memórias, só tem
existência em sua psique. E quem alimenta os seus pensamentos e emoções?
Se
algo do passado ainda te faz sofrer, só o faz, porque você ainda o alimenta com
sofrimento, ainda se identifica com o acontecido. Aceitar o passado não anula a
gravidade, penalidade, moralidade do acontecimento, contudo te retira da
condição de vítima – e não é preciso continuar sendo hoje vítima do que
aconteceu ontem. E, como já se fora uma vítima e não se a é mais, é possível
lidar com a situação de outra forma, atitude; com outro olhar para resolver as
consequências dela.
Em
minha infância, sofri abusos sexuais de cinco pessoas diferentes em épocas
distintas. O período dos abusos começou por volta dos meus 02 anos, indo até os
09, 10 anos de idade. Hoje eu aceito isso. E, ao aceitar não apago a gravidade
disso, porém deixo de estar no local da criança abusada e me torno o adulto que
lida com e resolve as consequências dessas vivências de violência.
Eu
escolho não sofrer mais por isso. Eu escolho não ficar nas prisões do
sofrimento. Eu escolho ter o melhor hoje possível; e como meu passado pode
agregar construtivamente para eu alcançar isso? De certa forma só sou o que sou
e faço o que faço hoje devido a esse passado. Hoje ofereço aqui mensagens que
são luz para jornadas de pessoas desconhecidas, pois conheci muita escuridão na
minha. Ofereço luz, pois quero luz. Dos vales sombrios pelos quais passei,
trago só os aprendizados que suas topografias me ensinaram.
Tenho
uma vida perfeita? Não. As feridas desses abusos da minha infância ainda
reverberam em meu eu adulto? Sim, mas lido com esses efeitos com
autorresponsabilidade e amor. Vim descobrir o amor-próprio apenas aos 30 anos
de idade, porém o descobri! E há 12 anos sei o que é me amar, me respeitar, me
aceitar. Desenvolvi autoconfiança, autoestima... Em meus processos de
autoconhecimento, fui aprofundando as extensões de minhas curas, atingindo
camadas cada vez mais fundas. Hoje sou uma cebola mais orgânica! Hahaha...
Enfim,
o que acontece conosco – por mais trágico que seja – não precisa ser
necessariamente nosso fim. O que acontece conosco tem o alcance que permitimos
que tenha. E esta permissão pode mudar com o tempo. Durante muito tempo meu
passado foi parede, bloqueio, freio... Hoje busco torná-lo impulso para os meus
voos, meus nados e meus passos. Outras vezes ele é o combustível para transmutações
também e aí renasço das minhas cinzas.
Esse
arcano nos fala sobre ressurreição,
renascimento. Talvez você não tenha se dado conta ainda do quanto já morreu e
nasceu nesta existência. Então fica aqui o convite para se dar conta destes
seus ciclos; e também para deixar morrer o que precisa morrer para que o novo
nasça, ou para que o velho renasça novo e irreconhecível .
Eita,
desabafei hoje! Acredito que nada é por acaso. Este texto veio tão natural e
fluido para mim. Bem, espero que faça sentido para você e que o ajude de alguma
forma. Espero que ele o inspire de alguma forma. Mas lembre-se: inspire e
expire. Respire bem e seja na vida o que quer receber dela. É a dica desse arcano para hoje, a semana e a vida.